Sou aquele que
Sou aquele que olha nos olhos do mendigo. Até por que, nem aquele mais digno teria a coragem de olhar, com olhos maternos, aos olhos do anjo negro, que carrega consigo a sujeira das ruas, embaixo de suas unhas, pretas. Sou aquele mais frio que nem consigo se afetua. Aquele que nem se toca, nem se vê e se enforca. Sou daqueles que não tocam quando falam, daqueles que abrem os olhos embaixo d´agua, daqueles que não são, mas falam. Sou aquele que boceja, e olha no meio de suas pernas quando as cruzam, e não se importam se o pau fica duro, ou se até hoje alguém não lhe disse, a sua boca está suja. Os meus passos longos que dificilmente se acompanham, às vezes duas ou três vezes mais rápidos do que as suas pernas curtas. Nada pessoal, mas às vezes lhe desejo o mal. São poucos os que falam, são poucos os que entendem alguém como eu: normal. Mas não leve um mal entendido para casa. Não leve a mal, pois se não te falam na cara, tampouco te falam. Cospem. Sou o cortejo do palhaço real, o sorriso da pessoa com síndrome de down, o grito da baleia, o sexo anal, o beija-flor atropelado, a farinha do mesmo saco, o Jornal Nacional, a moqueca baiana, o velho sacana, a polícia à paisana, o bandido sem grana, o preço da fama, o anel da cigana, o trago na bagana, e todas aquelas coisas boas, como a Coca-cola, que te fazem bem, mas te fazem mal.